domingo, 8 de julho de 2012

Resposta:

Talvez eu não a entenda, mas da mesma forma talvez (talvez) você nunca descubra como é ler nos lábios dela um suspiro afogado. Talvez ela não evite seus olhos e é possível que tivesse parado de roer as unhas porque podia segurar a sua mão. Ela subia nos seus ombros, te buscava no trabalho, desfilava com você. O sentimento invasivo, inconveniente, inevitável, inominável... Isso você não terá. Você não fará dela silêncio, fumante passiva, amante. Porque ela era sua (e talvez ainda seja). A mim cabe ser discrição e desapego, coisa que você nunca será. Não te invejo e vise-versa, afinal de contas, entre barcos de papel e pés de feijão, cutículas ensanguentadas ou não, ela é só.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Suponha que paleontólogos encontrem minhas pegadas soterradas por quilômetros de sedimentos. Suponha ainda que encontrem rastros de todas as chaves que eu deixei cair no chão, encontrem duas ou três marcas de salto alto, determinem minha altura e meu grau de lordose. Suposto isso, eles conseguiriam me catalogar? Saberiam do tanto que meu coração foi partido, dividido, reconstituído, do tanto que ele empedrou e se liquefez? Saberiam dos celulares que eu perdi e dos lábios que mordi? E o cheiro de cigarro no meu carro*, o gás butano, o banho de espuma, as batatas fritas, o norueguês desfiando meu cobertor, os suicídios, o sexo no elevador, as mensagens de texto, minhas namoradas, meus chifres, meus joelhos ralados, a arritmia cardíaca, a conta bancária e o rancor? E os damascos, os desabafos, meus decotes, seu violão, os erros gramaticais que eu corrigi das suas cartas e depois te devolvi, as fotos três por quatro e minhas unhas roídas? Se não souberem, que fique registrado aqui o campo semântico da minha vida.