segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Fortuito,


Palpito. Ajoelhada por cima de você, carimbada pelo corpo todo, eu palpito. Palpito deitada ao seu lado, sem calcinha, com os olhos nublados de sono, às sete da manhã. Palpito de pés descalços, te arrastando pelo corredor, bebendo água, enrolada no cobertor, escorrendo do sofá para o chão, arrancando a toalha da sua cintura, voltando pra casa com um cachecol feito de cabelos. Quando sinto o cheiro de praia que você tem atrás da orelha, me entrelaço nos seus dedos, te ouço cantar, você põe mão na minha coxa, puxa o meu cabelo, planta uma bananeira, fuma na janela, completamente perdido, seu quarto bagunçado, uma coleção de copos sujos na prateleira, te mordo mais do que beijo, sinto um sopro no peito, um receio, intuição. Sorrio em forma de desafio, protesto, para calar o medo, para calar o mundo.

domingo, 16 de setembro de 2012

Barco de papel,


Sinto um de repente.
É calmaria, mas é também afluxo, torrente.
É onda espumada, opaca, salgada, daquelas que puxam pro fundo e te dão somente o tempo necessário de subir à superfície e resgatar oxigênio para que você continue vivo. Isso porque em intervalos de cambalhotas, olhos arregalados e joelhos arranhados a vida fica em suspensão, esperando para ver se ocorre ou não. É bonança pura. Basta que você encoste os lábios em mim. A onda nasce no fundo do meu estômago, me puxa pra dentro e me afoga. Basta a mistura de suor, seus dedos abrindo caminho, nós nadando contra a corrente, a chuva de cinzas. Basta ainda que você me segure no colo, morda meu pescoço, a onda quebre contra a parede, despenquem os armários, eu caia na sua cama, o bater de talheres que entra pela janela vire calor, vire sorriso, vire grito.
Antes que eu morra afogada, antes que eu esqueça meus sapatos, antes que sua respiração asmática se acalme, antes que você ligue o ventilador, antes que habite minha mente...

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Do tanto que eu gosto de você/ Conselhos que eu bolei às cinco e quinze da manhã,


Meu pescoço continua manchado mesmo que eu esfregue pentes finos, maquiagem, água fria, água quente... Estamos um ao lado do outro, os dois salpicados de roxo. Estou pendurada em você, estou na beirada da sua cama e estou descalça. Seu gosto salgado, os lençóis encharcados, o colchão nu, as luzes acesas, meus olhos fechados, descascando seu ílio, dobrando os joelhos, respirando mecanicamente (como se faz? Inspira, expira, inspira, estoura, insânia, escape, instável, exala, inspira, expira). Encosto a cabeça na janela esperando que você esteja me olhando, porque uma das coisas que eu mais gosto no mundo é quando você olha pra mim. Vou embora esperando que você me dê um beijo a mais do beijo a mais que você me deu. Entro no elevador, coloco o cabelo por cima dos ombros, deito na minha cama, respiro, inspiro, fecho os olhos, tento me recompor, tento me proteger, tento parar de competir com você, tento ler incentivos no seu descaso. Mas você é silêncio. Eu sou também. Corra, então, salve-se! Eu não sou bom partido, não sou equilibrada, não vou te fazer feliz. Eu sou louca varrida, tinha que estar internada, tinha que estar amarrada, tinha que ser exilada. Sozinha, quando meu coração me pertence, eu sou normal, sou forte e coerente. Agora, quando você me apareceu, quando encontrou a brecha, quando me roubou... Aliás, não se chama de coração roubado o que foi entregue em uma bandeja ainda pulsando. É por isso que eu imploro: corra!

segunda-feira, 10 de setembro de 2012


Ele se parece muito comigo. No orgulho, na esquizofrenia, nos pés sujos. E aí não dá não. A gente vai acabar se matando.  

Gustavo,


Já perdi a conta de quantas vezes calhei de perder a carona propositalmente esperando que você me acompanhasse até a parada. Eu esperava ainda que talvez você me levasse em casa, deitasse ao meu lado na cama, puxasse o edredom por cima das nossas cabeças e decidisse casar comigo ali mesmo. De mãos abanando, eu acabava descendo a setecentos sozinha, ziguezagueava as casas tropeçando nas raízes e nos meus soluços. Sentava no banco do ônibus e descascava a película da janela. Nem bem eu fechava a porta de casa atrás de mim e eu já tinha te perdoado.
Eu jamais, nunca, de maneira alguma te pediria para que fosse comigo. Para mim era evidente: você tinha toda a obrigação do mundo de saber. Eu cometeria (como cometi) suicídio quantas vezes fossem necessárias para chamar a sua atenção. Eu era (como sou) vertigem de sentimentos. Você nunca vai saber (como não sabe) das minhas intenções ou do que eu exijo de você. Nem você e nem ninguém.