(...)
No dia seguinte começou minha transformação. De dia um: nebulosa, desgovernada, ligeiramente suicida. De noite outro: caroço, côncavo. Noutro dia, no calor, no suadeiro: alcóolatra, rodando resignada e vergada. De noite: do avesso, o banzo. Era como lobisomem. Se já era dia, eu me domava, mas no escuro e principalmente atirada na cama-enormessíssima, por cima do cobertor, no bafejo do ventilador, eu asfixiava a lembrança. Ou pior. O epílogo. O início. E o meio. Porque estava acravacado na minha memória, carcomendo-me. Eu não precisava lembrar. Misericordiosamente as trevas evaporavam e eu era desassombrada. As manhãs, claro, eram sempre bem mais quentes que as anteriores, eu derretia e escorria. As tardes eram piores e as noites abominosas! Eu entornava, gotejava e marejava. Estava longe de conjecturar, não calculava ainda, mas a seca qualquer hora chegaria em mim. Atravessaria o Trópico de Capricórnio e me desinundaria.
(...)

Nenhum comentário:
Postar um comentário