O primeiro ato se dá por dentro da minha cabeça. Ele começa: reviro a bolota dos olhos na órbita e dou de cara com uma moscona varejeira no meio do terreiro vazio. Ela me enxerga de volta, com os oitenta olhões abugalhados e parte para sua higiene. O de praxe, enrabiola a pedrinha alva entre as patas, incendeia o pito e puxa a fumaça pro fundo do estômago. Um pipoco alucinante de sineta se ataca entre os meus ouvidos. A porta do quarto bate (uma e duas vezes). Instala-se o éden do areal.
Tu - imenso, coberto de calos na ponta dos dedos - surge pela fresta dos tijolos. Como da primeira vez que te vi, me cai o queixo, entorno a cachaça, pego uma sementinha de papoula (a macumba começa assim) e lh’abraseio na cabeça do fósforo. Polvilho esse borralho numa bacia cheia de água, mergulho os pés, os ombros, as ancas dos joelhos, me lavo das unhas aos cabelos.
Ainda por dentro da minha cabeça tomo conta que nosso quarto está virando um roçado. Isto é, pilhas e pilhas de copos, bitucas e palhas de cigarro, um borogodó saindo pelas caixas de som, cheiro de pão e cheiro de queijo. Te deito estendido com o lombo das costas pra cima, me encurrupicho com a boca grudada no teu pescoço, alucinada no gosto de barro. Mal tua lingua começa a me circundar, mal sou brocada, mal te arranco as calças, a sineta bate mais uma vez e eu abro os olhos.
No avesso do avesso, topo contigo na prumada da janela. Chegara ali a pouco, depositava o olhinho baixinho de passarinho longe, agarrando entre os dedos um cigarro sem filtro com um naco de cinzas dependurado, eminente. Levanto, rodeio a porta, esfrego as mãos debaixo da torneira e volto pro nosso silêncio aterrador. Passado um tempo, você se senta ao meu lado, segura minha coxa, afasta as minhas pernas, toma meus braços, enreda meu pescoço, me chupa a orelha, tapa minha boca e com os tentáculos restantes se embrenha na minha tabaca. Eu acato e hiberno com os olhos cheios de água. Você se desaconchega de dentro de mim, não sei se terminado, coloca teu mangalho pra dentro da calça e se levanta. O brio da tua boca se mexe, como se fosse dizer algo. Mas não. Você dá meia volta e sai batendo a porta.
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