quarta-feira, 25 de maio de 2016

Capítulo 4

Fui presa novamente. Dessa vez o caso era grave. Antes que eu me adiante, quero deixar claro que tentei fugir, mas mal cheguei ao corredor do andar e a polícia já estava ali, inacreditavelmente eficiente. Em situações daquela magnitude, de assassinato deslegitimado, o julgamento era dispensado e a própria delegacia conduziria a punição, me explicaram. Eu tinha o direito de sentar, de quicar e de ficar caladinha.

Antes de mais nada, retiraram meu filho aos chutes, até que eu entrasse em trabalho de parto e expulsasse aquele corpinhozinho meladinho. Eu perdia minhas regalias, atrasaram o processo num total de dez horas para que eu conseguisse dar a luz, enfiavam coisas dentro de mim obstruindo a passagem; bastões, garrafas e os próprios punhos. Quando acabou tudo, deitei exausta e assisti enquanto eles abriam minha cicatriz e removiam meu útero, jogavam-no no lixo e fechavam a minha barriga deformada. 

Me deixaram quieta por alguns dias, até que veio uma mulher recolher o lixo. Foi quando me dei conta que a cela fedia. Era cheiro de lixo hospitalar, cheiro de gato morto, sangue coagulado, cheiro de carne velha e ovo podre. Ela usava uma máscara cobrindo o nariz e a boca, jogou água no chão e começou a escorrê-la com um rodo. Pediu que eu me mexesse para limpar aquela parte do piso.
- Isso não é nada, minha filha, não é nada.

Antes de ir embora, destacou um pedacinho do cabo, uma lâminazinha bem mixuruca de madeira. Entregou na minha mão, com o olho pregado no meu. Naquela noite veio um prato de arroz. Por cima, uma batata crua, a casca e tudo.

   


Nenhum comentário:

Postar um comentário